Imagem: Jornal Contábil
Maria Carolina Torres Sampaio é Sócia do GVM Advogados. Conta com mais de 15 anos de experiência no Direito Tributário, tendo atuado em grandes escritórios especializados na matéria, atendendo empresas nacionais e multinacionais, dos mais variados setores da economia, com atuação em processos administrativos e judiciais, inclusive nos Tribunais Superiores, avaliação de questões concretas relacionadas à tributação, riscos e planejamento tributário. Já prestou assessoria às maiores instituições financeiras do país, inclusive com vitória no Conselho de Contribuintes - CARF, em processo que envolvia valores superiores a 300 milhões de reais. Sua atuação é bastante relevante junto à grandes indústrias, empresas de serviços, seguradoras, mineradoras e construtoras.
Blog - Com a eleição de Rodrigo Pacheco para presidente do Senado e de Arthur Lira para a Câmara, é possível que aconteça a aprovação da reforma tributária?
Maria Carolina Torres - Apesar de todas as principais chapas candidatas à direção da Câmara e Senado terem defendido que uma Reforma Tributária seria essencial para o país, antes da eleição as maiores apostas na realização efetiva da reforma era com uma possível vitória do Deputado Baleia Rossi para a Câmara, na medida em que ele foi o autor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019, que propõe, em suma, a unificação do IPI, ICMS, ISS, COFINS e PIS em um único tributo federal, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com uma alíquota sugerida de 25%, e ainda a criação de um imposto seletivo (IS), incidindo sobre bens e serviços específicos, considerados “supérfluos” (bebidas alcoólicas, cigarros, etc).
Todavia, logo após a eleição de Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, ambos declararam que a reforma tributária será uma das prioridades de seus mandatos.
A atual direção das casas legislativas está planejando e parece, trabalhando, para que a atual Comissão Mista que estuda e elabora o projeto de reforma apresente seu relatório final ainda neste mês de fevereiro de 2021. O Presidente da Comissão, Senador Roberto Rocha (PSDB-MA), já se reuniu com os Presidentes das Casas e acertou este cronograma.
Ainda, segundo o atual presidente do Senado, a Reforma poderá ter sua tramitação iniciada em qualquer uma das Casas, “na medida em que nenhuma delas pretende ter o protagonismo da reforma”. Até então, Câmara e Senado não se entendia acerca de qual projeto deveria ser votado – Câmara defendendo a PEC 45, e Senado defendendo a PEC 110 (esta proposta pretende a extinção do IPI, IOF, CSLL, PIS/COFINS, Salário-Educação. Cide Combustíveis, ICMS e ISS e a criação de um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS, mas de competência Estadual e um imposto Federal Seletivo).
Nesse contexto, ao menos nos parece que alguma proposta será votada ainda este ano, mas não sabemos ainda o seu teor, até porque, além das PECs já mencionadas, o executivo federal também já apresentou uma proposta de reforma. Esta prevê apenas a extinção/unificação do PIS/PASEP e COFINS, a serem substituídos, em sua integralidade (PIS/Pasep sobre a folha; PIS/Pasep sobre importação; PIS/Pasep sobre receitas; COFINS sobre importação; e COFINS sobre receitas), por um único tributo chamado CBS – Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços.
Arthur Lira, atual presidente da Câmara, defende uma proposta mais ampla que aquelas atualmente em discussão nas Casas, mas que sobretudo simplifique o sistema e não onere ainda mais o consumo.
Outras questões ainda não colocadas formalmente no papel, mas muito em discussão, referem-se à tributação de lucros e dividendos, que tem a concordância pública de Lira, bem como uma possível criação de um imposto sobre pagamentos e transações financeiras (uma “nova CPMF”, ainda mais abrangente).
Este imposto sobre pagamentos e transações financeiras, pauta do Ministro da Economia Paulo Guedes, “poderia autorizar uma desoneração da folha de pagamentos das empresas”, mas é um tributo controverso, contestado por muitos congressistas e pelo próprio Presidente Bolsonaro.
Parece que este ano de 2021 será mais um ano de discussões tributárias, com esperança de que alguma reforma sobrevenha, mas ainda faltam alguns meses para podermos visualizar uma proposta final, com chances reais de aprovação a curto prazo.
Blog - Qual a importância da aprovação de uma reforma tributária? No Brasil, a população e os empresários pagam muitos tributos?
Maria Carolina Torres - Todas os cidadãos de um país têm obrigações tributárias – todos devem contribuir direta ou indiretamente com o financiamento das despesas coletivas, como aquelas com saúde, infraestrutura, segurança e educação.
No Brasil, ao contrário do que dita o senso comum, a carga tributária não está entre as mais elevadas do mundo, estando abaixo da média entre os países integrantes da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Enquanto a média da carga tributária dos integrantes da OCDE varia em torno de 34% a 35% sobre o PIB (ou sobre a renda da população), a brasileira oscila em torno de 32% a 33%. Por outro lado, entre os países da América Latina estamos no topo, já que a média da tributação nestes países se aproxima dos 22% sobre o PIB.
Temos, portanto, uma carga tributária, em termos de valor, semelhante àquela dos países desenvolvidos, que é onde pretendemos estar.
Os maiores problemas da tributação no Brasil residem no fato de que o sistema tributário é extremamente complexo - existem muitos tributos, de competências distintas para cobrança (União, Estados e Municípios) e um número absurdo de regras a serem seguidas pelas empresas e pessoas físicas - e sobretudo, regressivo - pessoas de baixa renda pagam mais tributos, proporcionalmente.
Destaque-se, por exemplo, os tributos incidentes sobre bens e serviços, que somados são 12 tributos diferentes, divididos nas três esferas do Governo, Federa, Estadual e Municipal.
Já no que se refere ao tempo para o cumprimento das leis, temos que no Brasil uma empresa gasta em média o total de 1501 horas por ano para se manter “em dia com o fisco”, comparado, por exemplo a 256 horas na Colômbia, 139 na França, que é considerado um pais burocrático, e uma média de 120 horas nos países desenvolvidos.
E para piorar o sistema, em nosso modelo tributário atual grande parte dos tributos incidem diretamente sobre o consumo, e não sobre a renda, implicando no fato de que, quanto mais pobre você é, maior é a porcentagem de tributação, em relação à sua renda, com que você deve contribuir.
Como as pessoas de baixa renda gastam a maior parte de seus rendimentos consumindo bens e serviços necessários à sua sobrevivência, acabam pagando uma conta maior que os ricos, pois as pessoas com melhores condições de vida, proporcionalmente, gastam menos seus rendimentos com estes itens.
Todas essas complexidades e distorções, além de prejudicarem diretamente a parcela mais pobre da população, representam verdadeiros entraves à produtividade e competitividade do setor produtivo.
Assim, a reforma do sistema é absolutamente essencial para o desenvolvimento do país, seja em relação à justiça tributária, seja em relação à um ambiente de negócios que favoreça o empreendedorismo e os investimentos.
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