A professora Rossana Thiré da COPPE/UFRJ explica o processo
de extrusão termoplástica aplicada a biopolímeros, utilizado na elaboração de
biocompósitos com caroço de manga, desenvolvidos em parceria com a Embrapa
Agroindústria de Alimentos.
Fonte: Agência Embrapa de Notícias
Aplicação da nanotecnologia para o desenvolvimento de
biomateriais de alto valor agregado com a utilização de resíduos industriais de
baixo valor comercial. Esse foi o desafio assumido por uma equipe de cerca de
30 pesquisadores de quatro instituições de pesquisa, sob a coordenação da
Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ). Os primeiros resultados, após quase
três anos de trabalho, mostram um tipo de plástico biodegradável, feito da
amêndoa do caroço de manga em mistura com o biopolímero natural, o PHBV, que
pode ser aplicado à indústria alimentícia, na composição de embalagens, e até
no setor médico para compor matrizes ósseas. Trata-se do primeiro passo para o
desenvolvimento de um plástico biodegradável comercial que utiliza como
matéria-prima resíduos da indústria alimentícia.
O trabalho recebeu homenagem na 5ª Conferência Internacional
sobre Polímeros naturais, biopolímeros e biomateriais (ICNP 2017 Rio). A
premiação foi destinada à pesquisa de Paulo Henrique Cardoso, doutorando em
engenharia de materiais do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e
Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ).
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE, 2013), o Brasil é um dos maiores produtores de manga do
mundo com uma produção de mais de um milhão de toneladas por ano. O
processamento industrial de manga para polpas e sucos resulta no descarte dos
caroços, correspondente a valores entre 40% e 60% do seu volume. A equipe de
pesquisa da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), em parceria com a Embrapa
Instrumentação (SP), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e Centro de Tecnologia
Mineral (Cetem) se reuniram em busca de alternativas para reutilizá-los,
visando gerar uma tecnologia que pudesse ser aplicada à indústria.
Plásticos de casca e caroço de manga
O objetivo do projeto foi dar uso e agregar valor a esse
resíduo de grandes volumes e alto impacto ambiental. “O desenvolvimento de novos
biocompósitos pode ser um caminho viável para o aproveitamento de coprodutos
industriais na fabricação de itens inovadores e sustentáveis”, afirma a
pesquisadora da Embrapa Edla Lima, que lidera os estudos. O projeto está
dividido em várias frentes de pesquisa para a utilização da casca e da amêndoa
do caroço de manga e argilominerais adicionados a uma matriz de polímeros
orgânicos: o PHBV — um biopolímero natural produzido por bactérias — e o PLA —
outro biopolímero natural, obtido de moléculas de ácido lático.
Resultados parciais do desenvolvimento de outro biocomposto
à base do biopolímero PLA serão apresentados durante o IX Workshop de
Nanotecnologia Aplicada ao Agronegócio, que ocorrerá nos dias 21 e 22 de
novembro na Embrapa Instrumentação, em São Carlos (SP).
Um dos principais desafios de toda a equipe se concentra na
utilização um material que não tem uniformidade, como o caroço de manga, em que
a casca e a amêndoa variam em composição e estrutura dentro de uma mesma
espécie vegetal, de época e local de origem. Os cientistas têm de driblar essa
dificuldade para garantir a reprodutibilidade da composição (formulação). Para
isso, já foram realizados mais de uma centena de testes, utilizando técnicas de
casting, extrusão, injeção e moldagem por compressão.
Foram avaliadas diferentes concentrações da amêndoa e da
casca do caroço de manga como carga de reforço em biopolímeros comerciais (PLA
e PHBV), adicionados ou não de quatro diferentes tipos de argilominerais, que
foram concentrados e organofilizados. Para avaliar resistência, cristalinidade
e elasticidade, os materiais resultantes foram analisados por calorimetria de
varredura diferencial (DSC), análise termogravimétrica (TGA), microscopia
eletrônica de varredura (MEV) associado à espectrometria de energia dispersiva
de Raios-X (EDS), ressonância magnética (NMR1H), Difratometria de Raios-X
(DRX), e infravermelho (FTIR).
A professora Rossana Thiré da Coppe/UFRJ explica o processo
de extrusão termoplástica aplicada a biopolímeros
Nova estrutura
A equipe do projeto já conta com bons resultados na obtenção
de novos biocompósitos, como os trabalhos com PHBV e a amêndoa do caroço de
manga, coordenados pela professora Rossana Thiré do Laboratório de Biopolímeros
da Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Coppe/UFRJ. Os pesquisadores
testaram, em diferentes concentrações, a utilização dos resíduos do
processamento da manga como reforço de biocompósitos biodegradáveis usando o
PHBV em moldagem por compressão. A adição do pó da amêndoa do caroço de manga
promoveu uma nova estrutura no polímero.
Os biocompósitos apresentaram maior interação
intermolecular, o que promoveu maior dispersão e distribuição do material de
enchimento. “As análises demostraram boa adesão, dispersão e distribuição em
amostras com PHBV. Os resultados indicam que a fabricação de biocompósitos pode
ser uma estratégia para a reutilização desse subproduto agroindustrial",
ressalta a professora e pesquisadora Rossana Thiré. Agora, a equipe está
voltada para dar continuidade ao projeto e chegar a um produto comercial. “Há diversas
possibilidades de uso na área alimentícia, médica e de lazer”, avalia Rossana.
De ossos artificiais a embalagens de alimentos
Há mais de quinze anos, a pesquisadora e sua equipe
desenvolvem pesquisas com polímeros a partir de matrizes orgânicas para a área
de alimentos (embalagens alimentícias, filmes de proteção de alimentos, copos e
talheres) e de bioengenharia (matrizes ósseas, fios de sutura de pele, moldes
biocompatíveis). “Devido à sua abundância e renovabilidade, a utilização de
resíduos agrícolas como matérias-primas é vantajosa para a economia, o meio
ambiente e a tecnologia, devido à sua baixa demanda de energia de fabricação,
baixa emissão de CO2 e alto nível de biodegradabilidade, quando comparados aos
compósitos de polímeros reforçados com enchimentos inorgânicos”, conta a
professora e pesquisadora Rossana Thiré. É fato que os biopolímeros naturais
ainda são até 12 vezes mais caros que os polímeros gerados por petróleo, mas
levam cerca de dois meses para se decompor no meio ambiente. “Há de se pagar
esse custo adicional para evitar que toneladas de plásticos tradicionais gerem
impactos ambientais por mais de um século”, afirma.
Pesquisas em andamento
A equipe de pesquisa da Embrapa Alimentos, da Embrapa
Instrumentação, do Departamento de Engenharia Química da UFRRJ e do Cetem estão
desenvolvendo a aplicação de argilominerais em mistura à matéria orgânica da
manga na matriz de PLA. O objetivo é obter melhor efeito de carga de reforço, o
que dá mais resistência ao material. Contudo, há outra barreira tecnológica a
ser transposta. A boa interação entre os argilominerais naturais e o polímero
não acontece espontaneamente devido à similaridade de cargas. Para isso, é
necessário alterar a estrutura molecular do material.
“Utilizamos a técnica de organofilização para modificar o
argilomineral concentrado e obter melhor aderência ao polímero. Trabalhamos em
escala nanométrica para a obtenção desses biocompósitos, a partir de
argilominerais”, conta Antonieta Middea, do Cetem. O argilomineral utilizado na
pesquisa provém de quatro tipos de montmorilonita/bentonita, advindas de
jazidas do Rio Grande do Norte e Bahia.
Pelas técnicas de peneiramento e densimetria se concentra a
fração de argila rica neste tipo de argilomineral. Esse processamento
possibilita a obtenção desses argilominerais para serem posteriormente
organifilizados e incorporados ao polímero. A vantagem é que são materiais
relativamente baratos. “O desafio dessa parte do projeto é obter um
nanocompósito com minerais e matérias orgânicas (polímeros naturais),
provenientes de subproduto agroindustrial. A soma de conhecimento entre as
instituições vem contribuindo para a obtenção em um biocompósito transparente,
biodegradável e de alta resistência. Os resultados preliminares são
animadores”, avalia Reiner Neumann, pesquisador líder do Cetem. Destaca-se que
esses quatro institutos em conjunto estão buscando o desenvolvimento desses
novos biocompósitos a partir de técnicas distintas de processamento, ou seja,
por casting e por extrusão/injeção termoplástica.
É importante ressaltar que essas pesquisas têm como meta
desenvolver biocompósitos ambientalmente corretos para servir como
matéria-prima de embalagens seguras de alimentos, agregando valor e uso ao que
antes era considerado lixo da agroindústria de sucos associado a argilas ou não
na função de "carga de reforço". Esses novos biocompósitos visam a
ser substituintes aos polímeros de petróleo utilizados com essa função.
Uso de tecnologia para o gerenciamento da equipe
Para garantir o comprometimento da equipe e gerenciar cada
etapa do desenvolvimento da pesquisa, a cientista Edla Lima também se apoia na
tecnologia. “Como são equipes que trabalham em locais diferentes, de diferentes
níveis – há pesquisadores seniores e em formação - acompanhamos de perto cada
etapa das análises e discussões técnicas pela rede social WhatsApp. Trocamos
fotos e vídeos, e envolvemos o grupo nos avanços da pesquisa e na busca de
soluções conjuntas para as dificuldades técnicas e operacionais que enfrentamos
no dia a dia”, conta a pesquisadora da Embrapa para quem a estratégia tem sido
eficaz pelos resultados gerados pelo projeto.
Aline Bastos (MTb 31.779/RJ)
Embrapa Agroindústria de Alimentos
Telefone: (21)
3622-9739
Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
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