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sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Publicação cita contexto de 1993, na oportunidade que participei do Curso Introdução à Paleontologia ministrado pelo Professor Carteli na FCJA-PB

Revista Tarairiú ........... issn 2179-8168
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TARAIRIÚ – Revista eletrônica do Laboratório de Arqueologia e Paleontologia da UEPB
Campina Grande, Ano II – Vol. 1 - Número 03 – Set/Out 2011

Contato

REVISTA TARAIRIÚ
Antiga Faculdade de Administração da UEPB, Av. Getúlio Vargas, S/N, 2º andar, Centro, Campina Grande-PB Fone: 83 9983.8198 / 83 8818.6682
revista.tarairiu@gmail.com

Expediente

Laboratório de Arqueologia e Paleontologia da UEPB
Coordenador: Prof. Dr. Juvandi de Souza Santos

CONSELHO EDITORIAL

Antônio Clarindo Barbosa de Souza PPGH / UFCG
Arno Alvarez Kern PUC-RS
Juciene Ricarte Apolinário PPGH / UFCG
Juvandi de Souza Santos UEPB - SPA
Lanusse Tuma UEPB
Luiz Eduardo Panisset Travassos PUC-MG
Marcelo Fagundes UFVJM
Marcio Mendes UFC

CONSELHO CONSULTIVO

Marcus Barboza TERRE ET EAU
Sueli Meira Liebig PPGLI / UEPB


EDITOR

Thomas Bruno Oliveira LABAP – SPA

Apresentação

A Revista Eletrônica TARAIRIÚ (issn 2179-8168) é uma publicação do Laboratório de Arqueologia e Paleontologia da UEPB (LABAP/UEPB), com sede em Campina Grande-PB, e surge como um novo meio de divulgação de pesquisas nos seguintes campos científicos:

1. História do povoamento pré histórico e histórico da América Latina;
2. Arqueologia;
3. Paleontologia.
4. Espeleologia.

As pesquisas e debates científicos nestas áreas compõe o objetivo da Revista que publica artigos inéditos, resenhas e entrevistas redigidos em português, inglês, espanhol ou francês. De periodicidade semestral, a Revista Tarairiú recebe contribuições em fluxo contínuo, de acordo com as Normas para Submissão.

Tarairiú possui Qualis B4 e sua denominação foi escolhida como uma homenagem a grande parte dos indígenas que habitaram os sertões nordestinos, sobretudo o interior da Paraíba, que foram os índios de vários grupos Tarairiú.
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A Megafauna Pleistocênica na Região do Cariri Paraibano

Mali Pereira TREVAS*
*Professora licenciada em História pela UFPB e participou das atividades desenvolvidas pelo
Professor Dr. Castor Cartelle na Paraíba.

RESUMO
O conhecimento da pré-história contribui para a compreensão de eventos naturais, como os que provocaram a extinção de espécies da fauna e flora, e com isso a humanidade traz à luz novas experiências e novas possibilidades de renovar o conhecimento acerca dos ciclos de vida no Planeta. A extinção da megafauna pleistocênica, assim como a extinção dos dinossauros, certamente foram eventos que se relacionaram com mudanças ambientais semelhantes as que se vive na atualidade. Entretanto, os centros acadêmicos da Paraíba e os órgão de fiscalização pouco tem se esforçado no sentido de estudar ou proteger as inúmeras jazidas paleontológicas de seu território, que a cada dia vão sendo saqueadas ou destruídas. Este artigo tem por objetivo sumariar as poucas ações de cunho científico em jazidas fosselíferas pleistocênicas na Paraíba e chamar a atenção das instituições de proteção e estudo destes lugares para que se possa efetivamente se realizar ações no Estado para a preservação e pesquisa deste patrimônio pré- histórico.

PALAVRAS-CHAVE: Jazidas fossilíferas, preservação, pesquisa

ABSTRACT

Knowledge of pre-history contributes to the understanding of natural events, such as those that caused the extinction of species of fauna and flora, and thus humanity brings to light new experiences and new possibilities to renew the knowledge of life cycles in planet. The extinction of Pleistocene megafauna, as well as the extinction of the dinosaurs certainly were events related to the environmental changes similar to those which we live today. However, the academic centers of Paraíba and the supervisory board have made little effort to study or protect numerous paleontologic of its territory, which every day are being looted or destroyed. This article aims to summarize the few actions of a scientific nature in fosselíferas Pleistocene deposits in Paraiba and draw the attention of institutions for the protection and study of these places so you can effectively take action in the state for preservation and research of prehistoric heritage . KEY WORDS: Fossiliferous deposits, preservation, search.

INTRODUÇÃO
O renomado paleontólogo Carlos de Paula Couto divulgou em 1962 as análises de uma importante expedição realizada pelo Nordeste a serviço do Museu Nacional do Rio de Janeiro, onde os fósseis da megafauna Pleistocênica encontrados na Paraíba receberam grande destaque juntamente com os fósseis cearenses. Nesta pesquisa foram identificados mamíferos dos grupos Marsupialia, Xenarthra, Artiodactyla, Perissodactyla, Proboscidea e Carnivora, além de aves e répteis.
O paleontólogo coletou restos de paleofauna nos municípios de Taperoá, Caiçaras, Catolé do Rocha e Curimatãs. Nesta tarefa, foram identificadas quatorze taxa semelhantes às formas presentes nos demais estados do Nordeste do Pleistoceno Superior:

Eremoterium laurillardi (Lund, 1842);  Panochtus sp Felinae; Glossotherium sp; Xenorihinotherium bahiensis; Ocnopus Gracilis;  Toxodontidae; Holmesina paulacoltoi;  Haplomastodon Waringi, Panochthus greslebni (1941);  Hippidium principale; Panochtus jaguaribensis;  Equus (Amerhipus) neoguaneos Paleolama major. (Bergqvist, 1989)

No final da década de 1980 os fósseis do cariri paraibano foram novamente estudados  através de uma pesquisa realizada pela paleontóloga Lilian Paglarelli Bergqvist, que revisou o trabalho de Paula Couto e publicou o seu trabalho para obtenção do grau de mestre pela UFRJ (1989).

Já no ano de 1993, os fósseis do Cariri voltam a ser pesquisados. Neste ano, o nordeste brasileiro foi marcado por mais um intenso período de estiagem1 o que representou sofrimento e fome para os nordestinos do semiárido. E neste contexto, no distrito do Marinho, município de Boqueirão, os trabalhadores rurais da frente de emergência foram recrutados pela prefeitura local para realizar a limpeza (esvaziamento) de tanques naturais retirando de lá todo o entulho que os obstruía para que, com a chegada das chuvas, este pudesse servir de cisterna para armazenamento de águas meteóricas. Este tanque em pauta se localizava nas terras do senhor Antônio Leandro, conhecido na região como seu Tempório. 

O trabalho de desobstrução se deu por meio braçal, com o uso de ferramentas agrícolas como picaretas, pás, enxadas e marretas, e todo o processo era realizado com grupos mínimos de dez homens remunerados pela Prefeitura Municipal com subsidio do Governo Federal. Durante três semanas de trabalho, mais de uma tonelada de material foi retirada do tanque.

Mesmo se tratando de operários leigos, alguns trabalhadores observaram que havia algumas pedras com formatos estranhos, parecendo, como diziam: “ossos do corredor de boi”.

Diante de tal singularidade, os campesinos passaram a acreditar que se tratava de animais vitimados pelo dilúvio bíblico. Este fato chamou a atenção do então prefeito da cidade de Boqueirão, João Fernandes da Silva, que em contato com o professor Dr. Josemir Camilo de Melo, da UFPB (na época assim denominada a atual UFCG) solicitando visita técnica da Universidade para saber quais as providências a serem tomadas.

Depois de descoberto de que se tratava de fósseis de animais quaternários extintos, o presidente da Fundação Casa de José Américo, professor José Elias Barbosa Borges, ofereceu a assistência necessária para acomodar o material encontrado bem como para articular uma parceria interinstitucional com o objetivo de dar aos fósseis o tratamento adequado sem que estes tivessem de ser removidos para outro estado. 

O prefeito de Boqueirão concordou com a sugestão e os fósseis foram remetidos a FCJA. Na ocasião houve algumas reuniões entre a FCJA, a UFPB a Prefeitura Municipal de Boqueirão e a PB-TUR e a professora Dra. Rosa Maria Godoy Silveira, doutora em História e pró-reitora exerceu um papel preponderante ao tomar a iniciativa de contatar a professora e bióloga Takako Watanabe, do departamento de Biologia da UFPB, campus de João Pessoa, que indicou o renomado Professor Dr. Castor Cartelle Maria Guerra, da Universidade Federal de Minas Gerais, para a identificação do material fóssil. Cartelle atendeu sumariamente ao convite não apenas para analisar os fósseis, mas prestou uma grande assessoria técnica, na qual alunos de graduação da UFPB puderam participar de um curso introdutório de paleontologia com aulas teóricas e práticas ministradas por ele. A Universidade Federal da Paraíba passou então a atuar em parceria com a PB-TUR e a FCJA até o início de 1994.

Como fora dito anteriormente, os fósseis estudados foram retirados de maneira aleatória e descuidada pelos trabalhadores rurais, no momento em que se fazia a limpeza no tanque do sitio do senhor Tempório. Devido a esse fato (corriqueiro na Paraíba e no nordeste brasileiro), diversas informações importantes sobre os processos tafonômicos que ocorreram naquele tanque foram perdidas e quase nada pode ser identificado.

Grande parte deste material retirado ficou no depósito da na Fundação Casa de José Américo (João Pessoa) e outra parte foi guardada na Escola Técnica Agrícola Municipal de Boqueirão. Apenas uma pequena fração deste material paleontológico foi classificada pelo paleontólogo da Universidade Federal de Minas Gerais, Castor Cartelle Maria Guerra, apresentando a seguinte taxa: Eremotherium laurillardi (Lund, 1842) ; Scelidodon Cuvieri; Hippidium Principale; Equus ( Ameriphus ) neogaeus; Pamphatherium humboldti; Haplomastodon waringi; Toxodon.

É importante salientar que no ano de resgate desses fósseis (1993) não foi adotada nenhuma forma sistemática de escavação arqueo-paleontológica no local. Além dos fósseis foram encontrados também material lítico e cerâmica associados, entretanto esse fato não é, por si só, suficiente para se caracterizar uma associação entre estes dois tipos de vestígios. Apesar desta classificação preliminar, este trabalho não foi publicado até o momento pelo professor Cartelle

A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO ‘’TANQUES’’ PARA A ARQUEOLOGIA E PALEONTOLOGIA DA PARAÍBA.

A Formação tanques trata-se de um fenômeno geológico originado a partir da erosão diferencial de blocos graníticos fraturados, trabalhados por esfoliação. Esta formação possui uma morfologia variada com aspectos esféricos, elípticos e ovóides com tamanhos e volumes  também distintos. Tais formações são comuns no Nordeste. O conteúdo destes depósitos está freqüentemente preenchido de restos fósseis de mamíferos pleistocênicos e indústrias líticas e oferecem as condições necessárias para a preservação de vestígios paleo-ambientais, além de vestígios arqueológicos.

Ocorrências semelhantes são encontradas na África do Sul, com a denominação local de „‟dambos‟‟. Dambos fósseis para representar depósitos de terraços fluviais antigos e recentes, formados em condições climáticas semelhantes àquelas dominantes no Pleistoceno continental do Nordeste Brasileiro. A formação „‟cacimbas‟‟ pode ser definida como uma unidade estratigráfica inserida na região semiárida do Nordeste típica do Quaternário.

Bigarella et al. (1994) salientam alguns sinônimos para a mesma formação: depressões de intemperismo, panelas de intemperismo, marmitas (caldeirões), cacimbas e gnamas. Já Oliveira (1989) adverte tanques, cacimbas e caldeirões são feições topográficas de origens diferentes, portanto sendo formações diferentes e devem ser analisados como tal. As cacimbas são feições artificiais, produto de trabalho humano, que consistem em um buraco cavado no sedimento até atingir o nível de água subterrânea. Destaca ainda que o termo “Formação Cacimbas” usado para os tanques como unidade formal não deve ser utilizado como uma unidade litoestratigráfica, por não preencher os requisitos para tal.

Na região do Cariri, estas ocorrências são bastante freqüentes podendo contribuir para o estudo da pré-história na Paraíba desde que seja feito um estudo detalhado do seu conteúdo bem como que se faça um levantamento e catalogação dessas jazidas para pesquisas futuras.

CONSIDERAÇÕES

Nos vizinhos estados de Pernambuco, Grande do Norte, Sergipe e Ceará as pesquisas paleontológicas tem sido realizadas por equipes de paleontólogos das universidades Estadual e Federal, produzindo discípulos e seguidores que darão continuidade às pesquisas e enriquecendo os conhecimentos sobre a Paleontologia do Nordeste.

Nestes estados, os vestígios fósseis encontrados são identificados com precisão e servem de referência para pesquisas futuras. Recebem tratamento e classificação adequados e são depositados em segurança nos centros de pesquisa, como é o caso do Museu Câmara Cascudo, da UFRN e da Fundação Mossoroense de VIngt Um Rosado, no município norteriograndense de Mossoró.

Sem desmerecer o esforço dos que lutam para ver uma Paraíba melhor, eu gostaria de encerrar este texto incentivando ao poder público e às autoridades por ele constituídas para que estes venham a atentar para o patrimônio cultural e natural enquanto ainda há tempo.

Lamentavelmente, após 49 dos estudos de Paula Couto no Cariri da Paraíba, 22 anos depois das pesquisas de Lilian Paglarelli e 18 anos depois da ocorrência de fósseis no tanque do Marinho, verifica-se que de lá para cá muito pouco mudou.

Até quando os paraibanos vão ter que aguardar ações das Universidades e dos governos no sentido de criar museus de história natural e centros de pesquisa capazes de abrigar o acervo existente em solo paraibano? Até quando será necessário requisitar professores visitantes e especialistas para cuidar os achados arqueológicos e paleontológicos deste Estado?

Sabe-se que existem pesquisadores interessados e comprometidos com a preservação do patrimônio local, mas isso não basta, pois estes necessitam de mais apoio e de comprometimento do poder público para viabilizar estudos.

Existem muitos hiatos quanto a origem pré-histórica paraibana aguardando por respostas que só poderão ser conhecidas à custa de muito trabalho e de muita pesquisa.

Enquanto não houver um espaço dedicado a arqueologia e a paleontologia na Paraíba, infelizmente não se poderá ir muito longe.

Questões como quais os animais que conviveram com os primeiros humanos que por aqui viveram, quais as técnicas utilizadas para a montagem das itacoatiaras, que idade tem as manifestações culturais mais remotas, etc. dependem de muito trabalho e de muita dedicação, que só será possível se houver compromisso do poder público deste estado.

Muitos fósseis encontrados em solo paraibano estão espalhados ou amontoados em laboratórios e museus de outros estados e países. As nossas itacoatiaras (especialmente a do Ingá) são divulgadas em todo o planeta e a Paraíba sabe muito pouco sobre elas.

Assim, como bons salários, bons serviços de saúde e infra-estrutura representam necessidades fundamentais para o cidadão, a preservação do patrimônio e memória cultural se faz necessária, pois um povo sem identidade e sem memória perde a cidadania e com ela se perde a capacidade de lutar pelos seus direitos. Evidentemente não se come nem se bebe fóssil, mas com eles podemos aprender que o mundo está em constante mudança e evolução e que devemos preservar o mundo em que vivemos e assim evitar ações que contribuam para processos de extinção da vida.

O conhecimento da pré-história contribui para a compreensão de eventos naturais, como os que provocaram a extinção de espécies da fauna e flora, e com isso a humanidade traz à luz novas experiências e novas possibilidades de renovar o conhecimento acerca dos ciclos de vida no Planeta. A extinção da megafauna pleistocênica, assim como a extinção dos dinossauros, certamente foram eventos que se relacionaram com mudanças ambientais semelhantes as que se vive na atualidade.

Ao se pesquisar as alterações ambientais de tempos pretéritos a humanidade poderá refletir melhor quanto ao tratamento que vem sendo dado ao Planeta e buscar alternativas de convivência sustentável bem adaptadas aos fenômenos ambientais naturais em vez de provocar alterações letais aos ecossistemas.Neste sentido torna-se imprescindível que o Estado da Paraíba assuma essa responsabilidade e procure se paramentar de conhecimentos também nesta área.

Recentemente foram criados novos centros universitários em municípios que possuem destacados sítios arqueo-paleontológicos, mas infelizmente não foi criado nenhum curso ou disciplina que contemplasse a nossa rica pré-história.

Os pesquisadores Câmara Cascudo, Castor Cartelle, Carlos de Paula Couto, Leon Denis, Maria de Fátima Ferreira, Giuseppe Leonardi, Lilian Bergqvist e muitos outros já pesquisaram ocorrências fossilíferas na Paraíba e alguns ainda podem relatar a importância de nosso estado para a compreensão da nossa pré-história, nossa paleofauna e paleoambiente.

Mas e nós? O que temos a dizer aos que chegam? Aos que nascem? Aos que nos visitam? Aos que nos indagam? Que respostas teríamos para os que nos questionam em sala de aula acerca da nossa pré-história?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BERGGVIST, L. P.; GOMIDE, M.; CARTELLE, C.; CAPILLA, R. 1997. Faunas-locais de Mamíferos Pleistocênicos de Itapipoca/Ceará, Taperoá/Paraíba e Campina Grande/Paraíba. Estudo Comparativo, Bioestratinômico e Paleoambiental. Revista Universidade de Guarulhos. Guarulhos, II(6):23-32.

BIGARELLA, J.J.; BECKER, R.D.; SANTOS, G.F.dos 1994. Estrutura e origem das paisagens tropicais e subtropicais. Vol. I – Fundamentos geológico-geográficos, alteração química e física das rochas, relevo cárstico e dômico. Florianópolis: Ed. UFSC, 425 p.

OLIVEIRA,L.D.D.de 1989. Considerações sobre o emprego da terminologia da “Formação Cacimbas” e caldeirões para os tanques fossilíferos do nordeste do Brasil. In: Congresso Brasileiro de Paleontologia, 11., 1989, Curitiba. Anais..., Curitiba: SBP, 1: 535-539.

PAULA COUTO, C. de 1962. Explorações paleontológicas no Pleistoceno do Nordeste. Anais da Academia Brasileira de Ciências. Rio de Janeiro, 34(3):19-20.